Colapso das correntes oceânicas do Atlântico ameaça clima global

Cientistas climáticos de todo o mundo estão em alerta para um possível e “devastador” colapso das grandes correntes do Oceano Atlântico. Essas correntes compõem o sistema conhecido como Circulação Meridional Atlântica (AMOC), um fenômeno de enorme escala que inclui a Corrente do Golfo e é responsável pelo transporte de calor essencial para o Hemisfério Norte.

Estudos indicam que a AMOC está a abrandar e, devido ao aquecimento global, poderá em breve atingir um ponto de inflexão, o que desestabilizaria drasticamente o clima da Terra.

Na segunda-feira (21), conforme informou Olhar Digital44 oceanógrafos de 15 países publicaram uma carta aberta apelando a medidas urgentes face ao enfraquecimento da circulação. Alertam que o risco de colapso foi “muito subestimado” e terá “impactos devastadores e irreversíveis” para o mundo.

Entre os signatários da carta está Stefan Rahmstorf, diretor do departamento de análise do sistema terrestre do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático, na Alemanha. Em entrevista ao site Ciência Viva, o oceanógrafo explicou a dinâmica da AMOC e seus potenciais efeitos globais.

O ponto de “não retorno” da AMOC pode estar próximo

Segundo ele, ao transportar calor para o norte, esse sistema de correntes oceânicas mantém temperaturas mais amenas na Europa e controla eventos climáticos importantes. No entanto, evidências paleoclimáticas mostram que quando o AMOC entra em colapso, ocorrem mudanças bruscas de temperatura, como o arrefecimento de até 20°C perto da costa da Noruega, causado pela interrupção deste transporte de calor.

Rahmstorf alerta que embora o último relatório do IPCC tenha estimado uma baixa probabilidade de colapso da AMOC neste século, estudos recentes indicam o contrário. A AMOC dá sinais de “alertas antecipados” de instabilidade, com flutuações naturais mais intensas, sugerindo que o ponto de inflexão pode estar próximo. Estes sinais preocupam os cientistas, que acreditam que a actual modelagem climática subestima a fragilidade da AMOC.

Um colapso total da AMOC teria consequências graves: a “bolha fria” no Atlântico Norte expandir-se-ia, arrefecendo partes do Norte da Europa e causando impactos climáticos como secas e temperaturas extremas entre o Norte e o Sul da Europa. “A interrupção da circulação afetaria também o transporte de oxigênio e CO₂ para as camadas mais profundas do oceano, reduzindo a absorção de carbono pelos oceanos e intensificando o efeito estufa”, afirmou o especialista.

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Instabilidade no sistema do Oceano Atlântico foi identificada há mais de 60 anos

Rahmstorf menciona que a possibilidade de colapso do AMOC é considerada há décadas, desde que o oceanógrafo Henry Stommel, em 1961, identificou a instabilidade do sistema. No entanto, só agora, com novas evidências e dados, os cientistas estão cada vez mais convencidos de que a probabilidade de colapso é significativa, justificando o alerta na carta aberta para intensificar a investigação sobre potenciais impactos e estratégias de mitigação.

“Globalmente, um colapso da AMOC poderia causar secas em regiões tropicais e afectar áreas agrícolas essenciais.” Esse cenário, destaca Rahmstorf, coloca em risco a produção de alimentos, especialmente trigo e milho, base calórica de grande parte da população mundial.

Embora o colapso seja reversível, a recuperação levaria séculos, fazendo com que o impacto durasse para as gerações futuras. Rahmstorf destaca que os efeitos de uma recuperação abrupta seriam ainda mais graves, podendo causar um rápido aumento da temperatura, agravando a situação climática na região.