As emissões de gases de efeito estufa do Brasil caíram significativamente em 2023, totalizando 2,3 bilhões de toneladas de CO₂ equivalente (GtCO₂e), uma redução de 12% em relação ao ano anterior. Esta queda representa o maior declínio percentual desde 2009, marcando um importante passo em frente para o país no cumprimento dos seus objectivos climáticos para 2025.
O levantamento, realizado pelo Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG) do Observatório do Clima, aponta que a diminuição das emissões foi impulsionada principalmente pela redução do desmatamento na Amazônia. A retomada das políticas de controle ambiental, como o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), foi um dos fatores decisivos para essa mudança.
Dados do SEEG revelam impacto do controle do desmatamento
- Segundo o Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG) do Observatório do Clima, a redução do desmatamento na Amazônia foi o principal fator para a queda nas emissões.
- As mudanças no uso do solo, que representam 46% das emissões totais do país, diminuíram 24% em 2023, o que é atribuído ao retorno do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm).
- Porém, outros biomas, como o Cerrado e o Pantanal, apresentaram aumento nas emissões devido à conversão da vegetação nativa.
A agricultura continua a ser a principal fonte de emissões
A agricultura, responsável por 28% das emissões totais, registou o quarto recorde consecutivo de emissões, crescendo 2,2% em 2023. Grande parte destas emissões tem origem na fermentação entérica, especialmente na pecuária, que libertou 405 milhões de toneladas de CO₂ e, superando a da Itália emissões totais. Somando as emissões provenientes do uso da terra, a agricultura representa 74% das emissões brasileiras, permanecendo como o maior setor emissor.
As emissões de energia aumentaram 1,1% devido ao aumento do uso de diesel, gasolina e querosene. Os transportes, que atingiram o nível de emissões mais elevado de sempre, registaram um aumento de 3,2%, embora o consumo recorde de biodiesel tenha moderado este crescimento. Em 2023, o biodiesel representará 12% da mistura com o diesel de petróleo, um aumento em relação aos 10% registrados em 2022.
O SEEG incluiu nos seus dados de 2023 as emissões geradas pelos incêndios, um fator cada vez mais relevante no contexto da crise climática. As emissões de metano e óxido nitroso provenientes da queima de pastagens foram monitoradas pela primeira vez. O setor dos resíduos, cujas emissões cresceram 1% no ano passado, está sob pressão do crescimento populacional e da necessidade de melhorias na compostagem e na reciclagem.
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Declarações de especialistas
David Tsai, coordenador do SEEG, destacou a importância da redução das emissões, mas alertou para a dependência do país no controle do desmatamento na Amazônia.
“A queda nas emissões em 2023 é certamente uma boa notícia e coloca o país na direção certa para cumprir o seu NDC, o plano climático nacional, para 2025. Ao mesmo tempo, mostra que ainda estamos excessivamente dependentes do que acontece no Amazon, já que as políticas para outros setores são tímidas ou inexistentes”, disse Tsai.
“O Brasil precisa de um plano de descarbonização consistente que realmente transforme a economia”, acrescentou o especialista, sinalizando a necessidade de medidas mais amplas em outros setores.
Bárbara Zimbres, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), abordou o problema do aumento do desmatamento em outros biomas, como o Cerrado e o Pantanal, fenômeno que ela chamou de “vazamento”.
“O Brasil está vendo o combate ao desmatamento na Amazônia surtir efeito. Mas, enquanto isso, o desmatamento em outros biomas, como o Cerrado e o Pantanal, está se acelerando. Esse ‘vazamento’ não é algo novo e precisa de uma solução urgente para que continuemos a ter chances de atingir as metas brasileiras de mitigação”, alertou Zimbres, destacando a necessidade de ampliar a fiscalização e o controle em outras regiões além da Amazônia.
Ingrid Graces, pesquisadora do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema), analisou o desempenho do setor de transporte e energia e destacou a importância dos biocombustíveis na contenção de emissões. “Os setores de energia e de processos industriais tiveram apenas um aumento modesto de emissões, porque houve redução de emissões nas atividades industriais e de geração de energia elétrica, apesar do transporte recorde em toda a série histórica”, explicou Graces.
“As emissões do transporte não foram maiores devido ao consumo recorde de biodiesel. Em abril de 2023, passou a representar 12% do volume da mistura com o diesel de petróleo — em 2022, esse percentual era de 10%”, detalhou, destacando o impacto do biodiesel na redução de emissões.
Gabriel Quintana, analista de ciências climáticas do Imaflora, enfatizou o desafio do setor agrícola em reduzir as emissões sem comprometer a produtividade. “A última redução nas emissões agrícolas no Brasil foi em 2018. Desde então, elas vêm aumentando e registrando recordes. Eles são impulsionados pelo aumento do gado, pelo uso de calcário e fertilizantes sintéticos de nitrogênio”, destacou Quintana.
“O desafio do setor, muito suscetível aos impactos da crise climática, é alinhar a mitigação das emissões de gases de efeito estufa com a eficiência da produtividade, em especial, a redução do metano e a adoção de sistemas que gerem sequestro de carbono no solo”, concluiu, reforçando a necessidade de inovação sustentável no setor.
Por fim, Iris Coluna, assessora de monitoramento do ICLEI, comentou sobre o setor de resíduos e o potencial de redução de emissões com melhores práticas de gestão. “As emissões de resíduos se estabilizaram nos últimos anos, após um forte crescimento desde 1990. Em parte, devido ao avanço na quantidade de resíduos enviados para aterros — cerca de 70% de todo o material coletado, em parte, devido ao aumento da queima ou recuperação de fonte de energia de metano”, explicou Coluna.
“Temos muito a melhorar na compostagem e na reciclagem a seco. A gestão de resíduos tem potencial para reduzir significativamente as emissões, mas o setor precisa implementar medidas em larga escala nas cidades brasileiras”, afirmou o assessor, indicando caminhos para o progresso no setor de resíduos.
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